Uma forma de onda cada vez mais distorcida

Uma forma de onda cada vez mais distorcida

Na contemporaneidade, o setor elétrico mundial se depara com constantes desafios, os quais são provenientes, em suma, das seguintes questões: necessidade de substituição do uso de fontes de energia provenientes de combustíveis fósseis por fontes renováveis, inserção de novas tecnologias ou melhoramentos tecnológicos nos distintos níveis do sistema elétrico (geração, transmissão e distribuição) e obrigação de garantir o fornecimento de energia elétrica de forma contínua e com coeficientes aceitáveis de qualidade.

No que se refere à substituição de fontes poluentes por renováveis, esta meta está alinhada com o compromisso assumido pelas principais nações do mundo, incluindo o Brasil, para diminuição da emissão de gases que contribuem para o efeito estufa. Já sobre o segundo elemento ressaltado, qual seja, inserção de novas tecnologias, pode-se mencionar o surgimento e a difusão das chamadas redes elétricas inteligentes (Smart Grids), além do barateamento de tecnologias já existentes empregadas em nível de transmissão, tais como sistema HVDC’s (High Voltage Direct Current) e FACT’s (Flexible AC Transmission Systems). Com relação ao terceiro aspecto mencionado, é simples perceber que a necessidade de garantir o suprimento de energia elétrica advém da correlata dependência de praticamente todos os setores da sociedade para com esta, fato que leva ao estabelecimento de regulamentações cada vez mais severas associadas tanto à qualidade dos serviços de fornecimento, quanto do produto energia elétrica.

Quando da avaliação deste cenário, percebe-se que apesar da existência de normas voltadas à garantia do fornecimento de energia com qualidade, não necessariamente a forma de onda é a preocupação primária. Assim, considerando tais mudanças, na sequência são enumerados os principais fatores que contribuem para a perda do formato senoidal da onda elétrica de corrente e tensão.

Geração

Neste quesito verifica-se o crescimento vertiginoso da geração eólica de energia elétrica, sendo, no Brasil, representado por uma verdadeira explosão de novas conexões na região Nordeste. Em sentido ascendente também está a geração de energia a partir de fazendas fotovoltaicas. Segundo a Agência Nacional de Energia Elétrica, a geração eólica já representa mais de 8% da matriz energética nacional. Estas duas formas de geração renováveis possuem interfaceamento com a rede via conversores de potência e representam importantes potenciais de geração de correntes não lineares, o que exige especial atenção, por parte do Operador Nacional do Sistema Elétrico Brasileiro, quando de suas conexões.

 

Transmissão

No sistema de transmissão tem-se, conforme já mencionado, o crescimento do número de elos de HVDC’s no Sistema Interligado Nacional (SIN). Neste tocante, destacam-se as linhas do Complexo Rio Madeira à Araraquara e também as redes provenientes de Belo Monte até a região Sudeste. Verifica-se também o surgimento de novas estações back-to-back, a exemplo das instaladas em Porto Velho para conexão de geração à região Norte. Tais dispositivos possuem características não lineares, sendo potenciais geradoras de distorções.

Outros elementos estão sendo inseridos à rede básica com o objetivo de otimizar a operação, aumentar a confiabilidade e estabilidade, mas, ao mesmo tempo, podem causar distorções harmônicas por terem operação caracterizada pela não linearidade. Dentre estes dispositivos estão FACT’s, que flexibilizam a transferência de energia, e equipamentos que visam a melhoria dos níveis de tensão com controle eletrônico de reativo, tal como os DVR’s (Dynamic Voltage Regulator), Statcom’s (Static Synchronous Compensator) e sintetizadores de energia de uma forma geral.

Distribuição

Esta é, sem dúvidas, a área do sistema elétrico onde estão ocorrendo as principais mudanças. Assim, pode-se citar a automação industrial que traz consigo o emprego massivo de ASD’s (Adjustable Speed Drives) para controle de velocidade e torque de motores empregados em sistemas de esteiras, ventilação e bombeamento, os quais provêm, via de regra, correntes harmônicas. Percebe-se também o advento do veículo elétrico que possui carregamento com potencial geração de distorções harmônicas nas redes de distribuição, além da substituição de sistemas de iluminação e uso cada vez maior de produtos com alto grau de eficiência em ambientes residenciais e comerciais. Outra importante questão é o crescimento quase que exponencial da geração distribuída no Brasil, promovida principalmente por sistemas fotovoltaicos interfaceados via conversores eletrônicos.

Salienta-se, ainda, o surgimento de sistemas armazenadores de energia, os quais são esperados em todos níveis do sistema elétrico, atuando também de modo não linear.

Portanto, diante do exposto, podemos afirmar que a manutenção da forma de onda senoidal em nosso sistema elétrico de potência demandará esforços cada vez maiores dos agentes reguladores, concessionárias, consumidores e pesquisadores da área.


*Ivan Nunes Santos é professor e pesquisador na Faculdade de Engenharia Elétrica da Universidade Federal de Uberlândia (FEELT/UFU) – Núcleo de Qualidade da Energia Elétrica – www.nqee.com.br

**Andréia Crico dos Santos é professora no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Triângulo Mineiro (IFTM) e estudante de doutorado na FEELT/UFU

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Fonte: www.osetoreletrico.com.br