16 set Inspeção em linhas de transmissão
A inspeção de linhas de transmissão exige a definição de critérios técnicos para avaliar suas condições e garantir a confiabilidade do sistema elétrico. A experiência demonstra que a simples aplicação de instruções técnicas não é suficiente para a gestão adequada desses ativos.
Com base em praticamente 18 anos de análise de diversas linhas de transmissão de 69 kV a 500 kV, em variadas configurações, foi possível estabelecer padrões de defeitos e métricas para determinar o momento mais adequado para se realizar as manutenções corretivas. No entanto, para garantir a qualidade das informações levantadas em campo, é fundamental contar com equipes altamente treinadas e capacitadas.
A manutenção da confiabilidade do sistema elétrico depende diretamente da qualidade das inspeções, que serve como uma das principais bases para a tomada de decisões estratégicas. Abaixo listei quatro componentes principais a serem considerados para realização das inspeções.
- CLASSIFICAÇÃO DE DEFEITOS E DADOS DE ENTRADA
Uma boa forma para se classificar os tipos de defeitos é tomar como base a tabela do Electric Power Research Institute (EPRI) que propõe a classificação dos defeitos e suas causas prováveis, conforme os modos de degradação indicados:
- B Biológico
- E Elétrico
- M Mecânico
- Q Químico
- T Térmico
Os critérios devem ser revisados periodicamente, considerando fatores como: desempenho, características geográficas, mudanças climáticas, evolução tecnológica e importância do ativo no SIN. O Quadro 1 mostra as categorias, as causas e modos de falha de componentes de linhas de transmissão.
Mesmo considerando esta estrutura apresentada pelo EPRI, é importante que as pessoas envolvidas no processo de inspeção e gestão de ativos conheçam as instalações de forma que as instruções de inspeção sejam estruturadas e personalizadas de acordo com as características físicas, condições climáticas, históricos de ocorrência e meio social, devendo a relação e a caracterização dos principais defeitos e interferências fazer parte das rotinas de trabalho e instruções técnicas.
O Quadro 2 apresenta esquematicamente os processos de entrada e tratamento das informações integrado a um sistema de gestão de ativos.
Atualmente, existe um movimento crescente para desenvolvimento de soluções tecnológicas inovadoras. A Internet das Coisas (IoT) e a Inteligência Artificial (IA) surgem nesse cenário, possibilitando a melhoria nos processos de inspeção e monitoramento de LT. Sensores IoT podem ser estrategicamente instalados nos componentes, coletando dados em tempo real de parâmetros como temperatura, vibração, corrente de fuga e intensidade de atividades elétricas. Os dados podem ser processados por algoritmos de IA, capazes de identificar padrões, detectar anomalias e ajudar a estabelecer diagnósticos, mesmo em condições complexas e em locais de difícil acesso. Além deste avanço, diversas tecnologias e ferramentas de inspeção podem ser embarcadas em drones ou helicópteros, proporcionando monitoramentos específicos e ágeis.
A figura 1 apresenta uma ilustração do projeto para monitoramento de torres estaiadas utilizando sensores IoT.
- TREINAMENTOS
Para garantir a qualidade das inspeções, as transmissoras devem oferecer treinamentos específicos e reciclagens que capacitem os profissionais a:
- Identificar e classificar defeitos
- Utilizar instrumentos de inspeção
- Analisar dados e imagens
- Aplicar técnicas de geoprocessamento para mapeamento e monitoramento
- SISTEMA DE GESTÃO DE ATIVOS
A gestão da manutenção por parte das transmissoras deve priorizar a adoção de técnicas modernas e boas práticas de engenharia para garantir a conservação das instalações. Um sistema de gestão eficaz deve incluir:
- Planejamento da manutenção, com base em prioridades e riscos
- Plataforma georreferenciada contendo localização precisa dos ativos
- Mapas contendo informações sobre vegetação, clima e riscos
- Histórico de falhas para identificar padrões e tendências
- Indicadores de desempenho para monitorar a eficácia das ações
- Estratégias visando aumentar a confiabilidade dos ativos e otimizar os tempos de manutenção
- LOGÍSTICA
Grande parte dos ativos está localizada em regiões de difícil acesso, distantes dos centros urbanos e rodovias pavimentadas.
A criação de um sistema georreferenciado dos ativos possibilita traçar rotas inteligentes otimizando custos relacionados aos deslocamentos, consumo de combustível, depreciação, reparo dos veículos e menor risco de incidentes com os motoristas.
- INSPEÇÃO E INSTRUMENTOS
- FOTOGRAFIA
São empregadas câmeras combinadas com lentes de longo alcance. Enfatiza-se a importância de treinamento nas técnicas de fotografia que também são aplicadas nas imagens feitas com drones.
Vantagens da obtenção de imagens de qualidade:
- Evidenciar defeitos em pontos de difícil visualização
- Redução de escaladas em torres
- Utilização das imagens em análises e treinamentos
- BINÓCULO
O binóculo oferece uma aproximação ótica que permite uma visualização detalhada dos componentes dos ativos. A imagem fornecida pelo equipamento deve ser estabilizada, de alta resolução e sem distorções.
- DRONE
A inspeção com drones tem se mostrado cada vez mais eficiente. A tecnologia exige treinamentos para operação, regulamentações e análise de imagens. É possível verificar uma redução significativa da necessidade de inspeções com escaladas.
- HIPSÔMETRO
O hipsômetro realiza medições de distâncias de obstáculos que possam influenciar a LT, tais como delimitação da faixa de servidão, travessias, tubulações, altura da vegetação, altura do cabo-solo e raio de queda de árvores.
- MEDIDOR DE EFEITO CORONA (ULTRAVIOLETA)
A medição de efeito corona indica atividade elétrica anormal. Devem ser consideradas na análise as possíveis fontes do efeito corona, tais como pontos irregulares nas ferragens, poluição ou partículas atmosféricas e ineficiência de anéis anti-corona. A criticidade deve ser definida em conjunto com inspeção visual e, ocasionalmente, termografia.
- TERMOGRAFIA
A termografia identifica defeitos em seus estágios iniciais através da análise de variações de temperatura. É possível diagnosticar defeitos em conexões, degradação devido à atividade elétrica, erro de projeto ou instalação inadequada.
- MEDIÇÃO DE TENSÃO DE ESTAIS
A tração dos estais é medida através do tensiômetro. O resultado das leituras deve ser comparado com o padrão de projeto e tolerâncias.
- MEDIÇÃO DE RESISTÊNCIA DE ATERRAMENTO
O elevado valor de resistência pode contribuir para o desligamento de linhas por descargas atmosféricas. A inspeção dos sistemas de aterramento das estruturas verifica se os valores de resistência estão dentro dos padrões de projeto.
Para a identificação da existência, comprimento e profundidade dos cabos de aterramento, é utilizado o detector de metais.
- POSITRON
O equipamento mede a distribuição do campo elétrico na cadeia de isolador, permitindo a identificação de defeitos através da análise de gráficos traçados por software. Deformações nas linhas de campo indicam o ponto de possível defeito. Existem modelos para isoladores convencionais e poliméricos.
- PACÔMETRO
O pacômetro permite localizar armaduras das fundações em concreto armado de forma não destrutiva. É utilizado para avaliação de conformidade e análise de patologias nas fundações.Também, é aplicado nos ensaios de ultrassom, na extração de corpos de prova de concreto.
- VIBRÓGRAFO
Vibrações eólicas excessivas podem causar fadiga de cabos ou danificar componentes como amortecedores e espaçadores. O vibrógrafo mede o nível de vibração e softwares analisam os dados para avaliar a integridade dos cabos.
- CONCLUSÃO
A inspeção em linhas de transmissão, quando realizada de forma eficiente e com o emprego de tecnologias adequadas, representa diretamente a otimização da gestão de ativos e contribui significativamente para a melhoria da confiabilidade do sistema elétrico de potência.
A qualidade das informações obtidas nas inspeções, em conjunto com a análise criteriosa, permite um planejamento assertivo das atividades de manutenção, reduzindo o risco de falhas inesperadas ou execução precoce de manutenções corretivas. Nesse sentido, a capacitação dos profissionais envolvidos em atividades de inspeção, por meio de treinamentos específicos, é fundamental para garantir a qualidade dos dados coletados e a correta classificação dos resultados.
A utilização de ferramentas tecnológicas, como drones, câmera ultravioleta, termografia, proporcionam maior confiança na forma como as inspeções são realizadas e maior precisão e agilidade na identificação de anomalias. A integração desses dados com sistemas de gestão de ativos permite a criação de modelos preditivos capazes de antecipar falhas e otimizar as atividades de manutenção.
Pelo exposto, conclui-se que a inspeção em linhas de transmissão é uma atividade estratégica para as empresas de transmissão, pois contribui para garantir a confiabilidade dos ativos e do sistema elétrico, a alocação adequada de recursos operacionais e o cumprimento das obrigações dos requisitos normativos.
EPRI – Electric Power Research Institute. AC Transmission Line Reference Book – 200 kV and Above. Third Edition. Palo Alto: EPRI, 2005.
SEMENSATO, Luis Felipe Guajardo. Panorama e diretrizes das principais técnicas de inspeção terrestre em linhas de transmissão de energia elétrica da rede básica. Monografia (MBA em Engenharia de Manutenção) – Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2015.
SEMENSATO, L. G.; AUGUSTO, F.C.; ALARCON, A. R.; OLIVEIRA, J.A. Requisitos e Técnicas Essenciais de Inspeção Aplicadas em Linhas Aéreas de Transmissão de Energia Elétrica de 230 kV e 500 kV. Encontro Regional Ibero-Americano do CIGRE. XIX ERIAC, 2023.
Sobre o Autor:
*Luis Felipe Guajardo Semensato é engenheiro eletricista pela UFF e possui MBA em Engenharia de Manutenção pela UFRJ. Atua no setor de transmissão de energia elétrica desde 2006 e atualmente é engenheiro Especialista de Linhas de Transmissão na TAESA e integrante do grupo técnico de linhas de transmissão (GTLT) da ABRATE.
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Fonte: www.osetoreletrico.com.br